sábado, 15 de junho de 2013

Missões Jesuíticas na Fronteira Oeste

INTRODUÇÃO
Tudo remonta ao velho mundo, precisamente dito ao território da Espanha onde na cidade de Loyola(atual município de Azpeitia cerca de vinte quilômetros a sudoeste de São Sebastião no País Basco) nasce aos trinta e um dias do mês de maio de 1491, Iñigo López conhecido como Santo Inácio de Loyola. Filho de família nobre, era o mais novo de treze irmãos. Em 1521 lutando como soldado, foi ferido no combate que visava defender a fortaleza de Pamplona, sitiado por Francisco I da França. Durante o período de recuperação Loyola dedicou-se a leitura da Vida de Jesus a da Legenda Áurea, sobre a vida dos santos. Foi para Paris em 1528, onde conseguiu o título de Professor de Filosofia. Em 1533 Ignácio já tinha seguidores, Pedro Favro, Francisco Xavier, Laínez, Salmerón, Simão Rodrigues e Bobadilha. No dia 15 de agosto de 1534, reunidos na Capela de Saint-Denis, na Igreja de Santa Maria, em Montmartre, fizeram o primeiro juramento de compromisso, inaugurando a "Companhia de Jesus". Em 1537 Santo Inácio e seus amigos viajaram até Itália para procurar a aprovação papal a sua viagem à Terra Santa. O papa Paulo III concedeu-lhes a aprovação e permitiu que fossem ordenados padres. Foram ordenados em Veneza pelo bispo de Arbe em 24 de junho daquele mesmo ano.
Ignatius Loyola – Santo Ignácio de Loyola


 Estes foram os primeiros passos para a construção do que viria ser a maior das Missões executadas em solo latino que galgou ser patrimônio histórico e cultural da humanidade. No decorrer deste trabalho de pesquisa focarei nas missões situadas atualmente em solo gaúcho, com destaque à Redução de São Miguel Arcanjo.
CHEGADA DOS ÌNDIOS ÀS TERRAS MISSIONEIRAS
Há mais de 2.000 anos atrás chegaram ao Sul, índios guaranis, provenientes das matas quentes e úmidas da Amazônia. Migraram para cá pois queriam garantir caça, pesca e terras férteis juntos ao rios Paraná, Uruguai e Jacuí. Unidos a natureza homens e mulheres desempenhavam funções. Os homens, caçavam, pescavam, preparavam a terra para a plantação e produziam armas a fim de defender sua tribo. As mulheres cuidavam do lar, da educação dos filhos, da produção de vestuários e materiais em cerâmica bem como da plantação e da colheita.
Eram os índios os donos das clareiras, organizavam-se em tribos vivendo em aldeias formadas por ocas, estruturas de madeira coberta por fibras vegetais. As ocas abrigavam todos parentes era a “Grande Família” . O mais forte e generoso entre os chefes da família era escolhido para exercer a tão nobre função de Tubichá, o cacique. O encarregado pelas curas e magias eram os Caraí, feiticeiros e sacerdotes dos guaranis. Tudo fluía nas tribos guaranis, tudo eram tão natural sem a presença de “estranhos”, era índio e natureza, mas isso não seria assim. Algo estava para mudar. Despertava pois no velho mundo as ambições de espanhóis e portugueses a par das terras meridionais.
AGORA É A VEZ DOS ESPANHOIS – JESUÍTAS NAS TERRAS DOS GUARANIS
No final do século XV as ambições Espanholas levou-os a descobrir em 1942 a América através da pessoa de Cristóvão Colombo. Logo após, na tentativa de reduzir as disputas por terras, portugueses e espanhóis fizeram um acordo, concebido como se a terra fosse tábua de mesa. Foi o Tratado de Tordesilhas, que dividia a América em duas grandes porções. Nessa época, ninguém sabia da existência do Brasil, mas, em consequência nossas terras ficaram divididas. Grande parte do Brasil atual pertencia à Espanha, inclusive as terras do Rio Grande do Sul, o que só foi confirmado anos após, com a chegada dos portugueses em 1500.
Na Europa, a Igreja Católica exercia grandes influências. A fim de combatê-la, surgiu então a REFORMA RELIGIOSA. A igreja reagiu e criou a CONTRA-REFORMA, promovendo mudanças, através da criação de novas congregações religiosas. Dentre elas, a Companhia de Jesus, em 1540, fundada por Inácio de Loyola. Com sua organização rígida, com disciplina quase militar, a Companhia forneceu catequizadores (padres jesuítas) para fortalecerem a presença da igreja Católica e contribuir na ampliação do Império Colonial.
As primeiras visitas para converterem os índios foram chamadas de Missões, um tipo de catequese, que não trouxe os resultados esperados pelos padres jesuítas, pois os índios voltavam logo aos costumes da vida guarani.
O governo espanhol precisava garantir a posse dos territórios conquistados e defender as fronteiras já estabelecidas, além de controlar a cobrança dos impostos. Foi por tais motivos que os espanhóis organizaram as reduções, em locais definidos para controle, defesa e catequização. A partir das reduções, os padres passaram a ter mais recursos para defender os índios da ameaça de serem escravizadas pelos bandeirantes paulistas e pelos comendadores espanhóis.
Em 1607, foi criada a PROVÍNCIA JESUÍTICA do PARAGUAI, que se tornou a maior ação social e cultural de catequização de índios americanos. Os primeiros povoados missioneiros foram fundados pelo jesuíta Antônio Ruiz de Montoya, nas terras férteis do Guairá, território do atual estado do Paraná. Outros jesuítas chegaram ao Itatim, no atual Mato Grosso.
A docilidade dos índios guaranis atraiu a cobiça e a ganância dos aventureiros, que vinham em busca de escravos. Para se protegerem das bandeiras de apresamento de índios, auxiliados e acompanhados pelos jesuítas, os guaranis abandonaram estas regiões e foram se estabelecer no TAPE terras do atual Rio Grande do Sul.

                                          PRIMEIRAS REDUÇÕES

Em 1626, o Padre Roque Gonzalez fundou a redução de São Nicolau, às margens do rio Piratini. Nos dez anos seguintes, surgiram dezoito novas reduções, dentre elas Assunção do Ijuí, Candelária e Caaró, onde o Padre Roque foi morto, em 1628.

Tanto esforço e logo tudo é reduzido a nada. Os bandeirantes Raposo Tavares (1636), André Fernandes (1637), Fernão Dias Paes (1637/38) e Domingos Cordeiro (1638) chefiaram a agressão indomável dos índios tupis paulistas contra os guaranis, índios infelizes e impotentes no enfrentamento com armas de fogo.
Em 1640, dá-se a RESTAURAÇÃO em Portugal. Os missionários conseguiram autorização do governo espanhol para armarem os índios com arcabuzes para poder se defender dos ataques dos bandeirantes. Os índios treinados e comandados pelos irmãos jesuítas derrotaram a Bandeira de Jerônimo Pedroso de Barros, em 1641, na batalha fluvial de M’Bororé. Assim, terminou o ciclo de investidas escravagistas, pois os guerreiros guaranis derrotaram quase dois mil bandeirantes.
Mas as reduções do Tape ficaram arrasadas. Padres e índios mudaram-se para a margem direita do rio Uruguai, deixando o gado, que haviam trazido em 1634, graças à ação dos jesuítas Cristóvão de Mendonça auxiliada pelo Padre Romero. Nas pastagens naturais, o rebanho solto reproduziu-se livremente, dando origem à Vacaria do Mar, atual área da pecuária do RS e da República do Uruguai.
Com a autonomia de Portugal, em 1640, ingleses, franceses, holandeses também foram atraídos pelas riquezas da América. O tráfico de negros para o Brasil foi intensificado. O Rio Grande do Sul despovoado e sem riquezas minerais, não despertava mais ambição dos paulistas. Suas cobiças foram voltadas ao descobrimento de matas e pedras preciosas. Por tais motivos, não houve mais bandeiras a devastar nossa região.
Em 1682, os jesuítas e os índios começaram a retornar à margem esquerda do rio Uruguai, às terras do atual Rio Grande do Sul, fundando os Sete Povos das Missões. Foram eles:
● São Francisco de Borja (1682); - pelo Padre Francisco Garcia.
● São Nicolau (1687);
● São Luiz Gonzaga (1687);
● São Miguel Arcanjo (1687) foi a capital;
● São Lourenço Mártir (1690);
● São João Batista (1697); foi fundada pelo músico e arquiteto Padre Antônio Sepp, que por ter sólida instrução de música vocal e instrumental, o que lhe deu grande destaque como músico. Os instrumentos de sua orquestra foram feitos por ele e seus discípulos. Extraiu o primeiro ferro das Missões, fazendo instrumentos de toda espécie, bem como os sinos do seu povo. Sua obra-prima foi o relógio da torre da igreja que, ao dar as horas, fazia desfilar, pelo mostrador, as imagens dos doze apóstolos.
● Santo Ângelo Custódio (1706). Antes de fundarem cada aldeia, os jesuítas cuidavam para que a escolha recaísse em lugares altos, de fácil defesa, com matas e água abundante. Com alguns índios, iniciavam as plantações e as construções provisórias. Quando as lavouras já estavam produzindo, vinham as famílias, que começavam a erguer as casas projetadas pelos padres. As povoações cresciam em quarteirões regulares, conforme a arquitetura e o urbanismo típicos dos espanhóis, e idealizado pelo Padre Roque Gonzáles, muito antes de morrer.
Com o trabalho coletivo dos índios e a coordenação geral dos jesuítas, surgiram os "30 Povos das Missões", em áreas que hoje fazem parte do Brasil, Argentina e Paraguai.
A etnia dos Sete Povos foi constituída basicamente pelo índio Guarani, do grupo Tape. Muitos dos costumes guaranis foram submetidos ao rigor da orientação religiosa, desestruturando a vida das famílias indígenas.
O plano urbanístico de cada redução estava assim constituído:
Toda a redução tinha a praça como centro e a igreja como prédio mais importante. Junto à igreja ficavam a residência dos padres, o colégio, as oficinas, o cemitério e o Cotiguaçu. A casa dos caciques e o Cabildo contornavam a praça.
O edifício mais suntuoso, mais vistoso era o TUPÃ-OGA, a CASA de DEUS, ou seja, a igreja, que cada povo esmerava-se para fazê-lo mais importante.
Na frente da igreja, estendia-se a enorme praça, onde as festas, torneios, exercícios militares se realizavam. Cercavam a praça, em fileiras paralelas, as casas do povo, todas uniformes, feitas de pedra, com alpendres e cobertas por telhas. Tais casas abrigavam a "grande família", conforme a tradição indígena. O
alpendre de uma casa juntava-se com a da outra, permitindo voltear um quarteirão sem tomar sol ou chuva. As casas não tinham janelas, mas tinham de 6 a 8 portas de cada lado, determinando tantos quartos, que eram necessários para cada família. As divisões internas eram feitas com couro ou esteiras, se necessário.
Os indígenas dormiam em redes de algodão, que serviam também de cadeira, quando não estavam em cadeiras de madeira ou ainda de cócoras ou no chão.
Num dos lados da igreja, estava o cemitério, em geral a oeste. Ao lado deste, ficava o COTIAGUAÇU, a casa grande, que abrigava as viúvas, as mulheres sozinhas e os órfãos sempre numerosos devidos às constantes guerras com os portugueses e amparados pelas famílias.
No outro lado da igreja, ficava o colégio, em alas, abrigando-se, entre elas e a igreja, um grande pátio cercado por alpendre, onde era ministrado o ensino. No colégio, só estudavam os meninos filhos de caciques e administradores; as meninas aprendiam "prendas domésticas". Ao lado do colégio, ficavam as oficinas, que ladeavam também um grande pátio cercado de alpendre, onde trabalhavam os artistas.
As casas públicas, iguais às particulares, como depósito de mantimentos de armas, a casa dos caciques e do cabildo. O Cabildo ladeava a rua central e era a sede da administração municipal, uma espécie de Prefeitura Municipal.
Na enfermaria, localizada ao lado do cemitério, atendiam-se os doentes em estado mais grave ou que apresentavam perigo de contágio. Os doentes comuns ficavam em suas próprias casas, onde os enfermeiros os visitavam duas vezes ao dia.
Os índios eram enterrados no cemitério, os jesuítas ficavam enterrados na igreja, junto ao alto mor. Atrás da igreja, os padres mantinham a horta, o pomar e o jardim.
Nos locais de água, a população construía fontes de pedras para se abastecer, lavar a roupa e tomar banho.
Na periferia da redução ficavam os TOMBOS, onde se hospedavam os visitantes, para evitar o contato direto dos índios com os estrangeiros. Era a hospedaria, o hotel da época, nas missões.
Os guaranis das missões deviam respeitar o rei espanhol e pagar os impostos, através de serviços prestados, construindo fortificações e defendendo o
território. Estavam subordinados aos governos de Assunção e Buenos Aires, que exerciam uma fiscalização rigorosa. Em Em cada redução havia apenas dois padres, um cura e um auxiliar, para coordenar todas as atividades.
A agricultura mereceu sempre um cuidado especial para se prover à alimentação dos índios.
Como previam as leis espanholas, os índios deviam trabalhar quatro dias na semana no ABÃ-BAÉ a "Terra do Homem", terras particulares, que garantiam o sustento da família. Outros dois dias eram dedicados ao TUPÃ-BAÉ, a "Terra de Deus", terras coletivas, que produziam alimentos para quem trabalhava no campo. Parte da produção do TUPÃ-BAÉ era trocada por mercadorias, que não eram produzidas nas reduções. Uma por ano, uma barca levava para Assunção a Buenos Aires o excedente comercializado pelos jesuítas.
Os bois e os instrumentos, que utilizavam na agricultura eram sempre de TUPÃ-BAÉ. Os índios cultivavam milho, mandioca, abóbora, algodão, cana, hortaliças, árvores frutíferas.
A criação de gado fazia-se em estâncias longe dos povos. A propriedade era sempre da comunidade. A estância de São Miguel era Santa Tecla, no atual município de Bagé, distante quase 600 km, São João, no Tupanciretã, e outras. Nessas estâncias também se criavam cavalos, ovelhas, cabras, porcos, galinhas.
Os índios também se serviam do leite, couro e sebo. Estes últimos eram muito cotados na época.
Em 1709, os jesuítas fundaram a VACARIA dos PINHAIS, em terras do atual município de VACARIA.
Música, canto, dança teatro, desenho, pintura e escultura foram os recursos usados pelos jesuítas, como apoio à catequese. Desde pequenos, alguns índios aprendiam a tecer e a fabricar instrumentos musicais com cópias originais europeias.
Os guaranis tinham capacidade para criar, para copiar. Eram escultores, cantores, músicos, impressores, pedreiros, ferreiros, cujos trabalhos evidenciam a presença dos traços culturais indígenas na produção.
Nessa época, não havia fábrica, mas oficinas e todos trabalhavam sob a orientação de um mestre. Os guaranis tiveram, como mestres, muitos jesuítas de formação sólida, nas ciências e nas artes. Entre eles, destacamos o Padre Antônio Sepp, quem incentivou a música, a botânica, iniciou a fundição de ferro; o padre José Brasanelli, arquiteto e escultor; o Padre João Batista Primolli, responsável
por grandes obras, como a igreja de São Miguel Arcanjo. Imprimiram livros, criaram esculturas, pinturas, relógios de sol, sinos.
Todos os artífices trabalhavam pela comunidade e moravam na comunidade.
O ferro extraído, no povo de São João Batista, foi uma iniciativa do Padre Antônio Sepp, inclusive sua fundição serviu para a fabricação do sino e do relógio da igreja, por ele mesmo fabricado.
Nos Sete Povos das Missões, extraía-se erva-mate, ferro e madeira. A erva-mate era buscada a grandes distâncias como na Serra de Botucaraí, na área do atual município de Soledade e na mata do Uruguai. Logo, os índios aprenderam a fazer mudas e plantaram grandes ervais.
A madeira era extraída para o uso do povo e com ela foram feitas muitas obras de arte como imagens, candelabros e outras.
Os índios Guaranis das Missões vestiam-se conforme a orientação dos padres jesuítas. As roupas de uso comum eram feitas pelas donas de casa. Umas faziam o fio, outras teciam. Todas confeccionavam as roupas para o uso doméstico. As melhores confecções eram reservadas para as viúvas e órfãs. O sacristão confeccionava as alfaias da igreja.
Homens e mulheres recebiam, em princípio, um traje por ano e as crianças dois. O tecido e o corte eram uniformes.
Os homens trajavam um gibão e culote, semelhantes à roupa dos espanhóis e, por cima, uma blusa de pano branco (o poncho dos gaúchos). As mulheres trajavam um vestido sem mangas, que descia até os calcanhares, chamado de TIPOY, amarrado à cintura com CHUMBÉ. Não havia pessoa andrajosa nas missões.
Os índios não se acostumaram ao uso de meias e sapatos, usando - os forçadamente somente em ocasiões especiais.
O FIM DAS MISSÕES
Em 1750, o Tratado de Madrid determinou novos limites na área do estuário do Prata. Tal acordo causou grande descontentamento entre índios, provocando a GUERRA GUARANÍTICA, de 1754 a 1756, liderada por Sepé Tiarajú.
A guerra não resolveu as questões de limites, mas fez com que Portugal e Espanha voltassem atrás nas suas decisões.
Mas já não existia mais entusiasmo como antes, nem mesmo a condição de vida era as mesma.
Na Europa, cresciam as pressões contra a igreja e os jesuítas foram acusados de liderarem a Guerra Guaranítica. Com as manobras políticas, os padres acabaram sendo expulsos dos territórios da América, em 1767, quando Carlos III, rei da Espanha, assinou o decreto. Em 1768, terminou o apostolado jesuítico nas missões.
Os jesuítas foram substituídos por curas de outras congregações e por administradores civis.
Assim terminou a prosperidade dos celebrados aldeamentos, acabando-se a tranquilidade e o bem estar dos guaranis. Começou o êxodo. Em 1801, a população era muito pequena na região.
Dos Sete Povos das Missões e as reduções, que existiram no Rio Grande do Sul, restam hoje vestígios de São Nicolau, São Lourenço Mártir, São João Batista e São Miguel. sendo este declarado Patrimônio Histórico da Humanidade, pela UNESCO, em 1983, além do grande acervo de imagens missioneiras, no Museu das Missões em São Miguel das Missões.
Estudar as Missões e as Reduções é reconhecer os marcos que ficaram na face da América.
A história das missões é uma das raízes da cultura regional gaúcha, que faz parte de variedades de culturas, que integram a identidade brasileira.
Fotos de São Miguel das Missões












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